Peça a uma mulher de uma aldeia remota no Butão para agir como se ela estivesse envergonhada, divertida ou intimidada, e as chances de uma adolescente nos Estados Unidos interpretar precisamente essas emoções é bem próxima de 100%. Isso porque os seres humanos têm dezenas de expressões universais para transparecer suas emoções e, de acordo com uma nova pesquisa, essas expressões são reconhecíveis por várias culturas.
O único detalhe é que essa gama de emoções é maior do que pensavámos.
Nossas emoções universais têm um núcleo comum
Durante décadas, os cientistas têm sustentado que há seis expressões emocionais humanas básicas, e que todas elas são reveladas pelo rosto. Seriam: felicidade, tristeza, nojo, medo, raiva e surpresa.
Mas cerca de cinco anos atrás, Daniel Cordaro, psicólogo da Universidade da Califórnia em Berkeley e da Universidade de Yale (ambas nos Estados Unidos), começou a se perguntar se havia mais. Para descobrir a resposta à essa inquietação, ele passou horas observando as pessoas de todo o mundo em cafés, assistindo vídeos de crianças no YouTube e desembrulhando presentes de aniversário com grandes sorrisos em seus rostos. E notou que, apesar das diferenças culturais, muitas expressões que antes eram julgadas como mais “complicadas” pareciam ser semelhantes entre as diversas culturas.
Para ver se estava certo, Cordaro e seus colegas mostraram a pessoas de quatro continentes uma descrição de uma linha de uma história (que os pesquisadores traduziram em várias línguas nativas), tais como: “seu amigo acabou de te contar uma história muito engraçada, e você está se divertindo muito com isso”, ou “seus amigos te pegaram cantando em voz alta a sua música favorita, e você se sente envergonhado”. E então pediram aos participantes para descreverem esses estados emocionais usando palavras.
Quando os pesquisadores compartilharam essas encenações emocionais com pessoas de culturas estrangeiras, esses espectadores puderam relacioná-las com 30 expressões faciais e vocais com maior precisão do que se tivessem simplesmente imaginado. Curiosamente, expressões de simpatia, desejo e timidez não pareciam se traduzir através das culturas.
A equipe também comparou pessoas na China, Japão, Coréia, Índia e Estados Unidos quando estas emoções foram reencenadas, e, assim, codificaram 5.942 de suas expressões faciais. Isso significou gravar meticulosamente as posições de 25.000 músculos faciais diferentes, segundo Cordaro.
A descoberta de padrões
Assim, a equipe descobriu alguns padrões incríveis. Segundo Cordaro, há muitas semelhanças na forma como as pessoas produzem determinadas expressões. Algumas são incrivelmente parecidas em todas as culturas, ao passo que outras, como o “uau” de reação a alguma coisa bonita, não é universal.
A maioria das pessoas inicialmente estudadas nesta pesquisa pertencia a culturas marcadas por uma forte presença da TV, smartphones e outras tecnologias. Ou seja, as expressões emocionais examinadas podem não ser verdadeiramente universais.
Então Cordaro e seus colegas viajaram para uma aldeia remota no Butão que jamais havia sido visitada por estrangeiros, e pediram que os moradores relacionassem tons de voz com uma história que estava sendo descrita. Para 15 das 17 expressões vocais, os moradores puderam escolher a situação correspondente muito melhor do que se apenas tentassem adivinhar, sem a ajuda do recurso de voz.
Esses resultados sugerem que uma grande parte do repertório emocional humano é universal e que as expressões emocionais vão muito além do que os seis tipos básicos descritos anteriormente por pesquisadores. As descobertas, contudo, não devem subestimar o papel da cultura, completa Cordaro. Para ele, “cada emoção resume-se a uma história”. E a “cultura nos ensina as histórias em que usamos essas emoções”, explica.
Traduções
Enquanto traduziam conceitos emocionais básicos para moradores butaneses, os pesquisadores encontraram “chogshay”, uma palavra butanesa que não tinha equivalente em inglês e que mais ou menos se traduz como um contentamento fundamental que é independente do estado emocional atual de uma pessoa.
Por exemplo: alguém poderia estar momentaneamente com raiva ou se sentindo terrivelmente mal, mas o seu sentido subjacente de bem-estar poderia ainda estar intacto.
Claro que essa noção de “chogshay” era completamente estranha para Cordaro, que foi usada para definir bem-estar em termos do que ele tinha, como o que ele estava sentindo ou se esforçando para sentir. Mas, através de um processo de reconhecimento da universalidade de muitas emoções humanas, e depois de completar uma rodada de meditação budista na Tailândia, Cordaro experimentou o tal estado “chogshay”.
“Eu me senti completamente vazio”, disse Cordaro. “Foi o momento mais bonito em toda a minha vida”.
Diferentes pontos de acesso
O que isso tem a ver com a universalidade das emoções? O raciocínio de Cordaro é o seguinte: esse estado de contentamento provavelmente está disponível para as pessoas de qualquer lugar do mundo, o tempo todo. Mas dependendo da cultura em que uma pessoa esteja inserida, ela pode acabar não conhecendo essa emoção, porque foi criada em um ambiente que “expulsa” essa consciência.
Sendo assim, podemos ter muitas emoções de caráter emocional, mas se quer temos acesso a elas. Porque, culturalmente, muitas são “abafadas”.
Ele também levanta a hipótese de que as pessoas podem chegar a este estado de muitas maneiras diferentes, seja por autorreflexão, meditação ou atingindo um “fluxo” em atividades altamente envolventes.
FONTE: Hypescience.com
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